Olhe ao Redor: Sobre a Paisagem Cultural da Localidade


por Yan Breno graduando de Geografia da Universidade Federal Fluminense

Peguei-me novamente lendo Cosgrove e seu interessante texto “A Geografia Está em Toda Parte”. Digo lendo novamente pois como estudante de geografia, esse material é imprescindível para a formação de tal, que por consequência, acabou passando pelas minhas mãos logo no início acadêmico.  Para quem nunca ouviu, “A Geografia Está em Toda Parte” de Cosgrove ensaia sobre a paisagem interferindo no meio social e cultural ao mesmo tempo de como o social e sua cultura interfere na paisagem. Não irei aqui resenhar sobre esse texto, muito menos discordar das ideias presente ali, irei simplesmente demostrar meus sentimentos sobre a paisagem que admiro todos os dias em seu sentido geográfico.

Devo confessar que em meio a minha releitura peguei coisas do texto que anteriormente não havia pego. Comecei a compreender melhor a paisagem em si e como ela no meio social e cultural era moldada. A paisagem é formada por inúmeros elementos dos domínios naturais e humanos que se articulam entre si, e nesse sentido como diz Cosgrove, podemos dizer que ela é de fato uma “maneira de ver”, um jeito do compor e harmonizar o mundo.

Pensando sobre esse conceito de paisagem relacionado a cultura e entendendo os exemplos dados por Cosgrove, indaguei-me de como essas ideias se encaixariam na paisagem que observo todos os dias. Quando digo sobre a paisagem vista por mim, refiro-me ao meu bairro e as coisas vizinhas a ele, e por isso preciso entender primeiramente como a cultura dominante molda o ambiente a sua maneira do mesmo modo que a paisagem alternativa coexiste a ela. Além disso, é importante observar como essas culturas manifestam sua dominância através de seus símbolos.

Partirei do principio da paisagem da cultura dominante. Vivo em um bairro típico de classe media baixa na zona norte da cidade do Rio de Janeiro. É comum que bairros como esse tenham paisagens extremamente parecidas. Falando exclusivamente de onde moro, mas assim como os outros ao redor, possui como principal característica o comercio. Comercio esse, que pensando numa logica global social, molda a paisagem natural para uma, culturalmente dominante. O interessante é que o ambiente fora totalmente modificado para que a cultura dominante do capital pudesse se instalar ali. A partir disso podemos perceber que além dessa paisagem cultura dominante, existe dezenas de paisagens alternativas que coexistem fortemente.

Meu bairro, infelizmente é conhecido por sua violência. Em contrapartida a paisagem da cultura dominante, há uma paisagem também típica de outros bairros da cidade: a favela. Podemos dizer que ali seria uma paisagem alternativa excluída, não no sentido de que um dia ira desaparecer, mas sim na exclusão que a própria sociedade, a cultura dominante, impõe. Ao visualizarmos esses dois tipos de paisagem, veremos o nítido contraste dos símbolos presentes em cada uma delas. Não entrarei na discussão desses símbolos, todavia, se formar analisar profundamente esses simbolismos, iremos perceber que eles não são tão diferentes.

Outras paisagens alternativas que podemos encontrar são as que Cosgrove chama de residuais, já que tem pouca significação comparada a cultura dominante. É interessante observar que grande parte dos bairros cariocas possuem raízes da cultura afro-brasileira, e em meu bairro não é diferente. Existe uma escola de samba não tão conhecida, mas tradicional para cidade que querendo ou não moldou a paisagem do bairro. Além da escola de samba e em como todo lugar, há a uma importante igreja que modifica a paisagem em determinadas épocas do ano. Existem outros tipos de paisagens alternativas no bairro. Uma delas são as paisagens dos bares que por mais que sejam diferentes esteticamente, são parecidas essencialmente. Por isso, desse modo, se pararmos para examinar ao nosso redor perceberemos dentro de uma paisagem dominante diversas outras diversas paisagens alternativas, onde muitas das vezes são ignoradas e não entendidas.

Admito que essas características são bastante superficiais sobre a paisagem e é preciso uma analise mais aprofundada para o seu real entendimento. Mas como o intuito desse pequeno texto era demostrar o quão interessante é observar e conhecer a paisagem que o rodeia e não simplesmente orquestrar um texto acadêmico, acredito que após a leitura cada pessoa, geógrafo ou não, possa desvendar os simbolismos de cada e para cada paisagem. Como nos diz Cosgrove, as paisagens tomadas como verdades de nossas vidas cotidianas estão cheias de significados que precisam ser decodificados. Tendo isso em mente, conheceremos e entenderemos nos mesmos, os outros e esse incrível mundo que compartilhamos.

Comentários

  1. Excelente reflexão, Yan!
    A geografia fica ainda mais encantadora - e faz muito mais sentido! - quando passamos a nos questionar sobre aquilo que nos cerca, nossa realidade. Assim temos percepção não só de elementos da paisagem que são nítidos, mas também daqueles que estão ocultos. Isso é geografia!

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